Decisão da Justiça gaúcha, confirmada pelo STJ – e aí ampliada quanto aos juros de mora – condenou o tabelião Sérgio Afonso Manica, titular do 5º Tabelionato de Porto Alegre, a indenizar o comerciante Marcos Antonio Ceccon, por prejuízos decorrentes de irregular reconhecimento de assinatura.
Em 24 de abril de 2008, Ceccon adquiriu uma camioneta Ford Ecosport, ano 2004, que, posteriormente, soube, tinha sido clonada por Vitor Hugo Almeida e Rossinei da Silva Correa, depois condenados definitivamente por estelionato e por outros delitos de mesma natureza.
A ação cível de indenização revela que, com o objetivo de venderem o veículo, os golpistas produziram falso certificado de registro e licenciamento de veículo, “emplacaram” o veículo com placas clonadas e, posteriormente, publicaram anúncio em jornal, fornecendo número de telefone celular para contato dos interessados.
Ceccon ligou para o telefone anunciado e falou com o falsário que disse ser funcionário do Foro Central de Porto Alegre. Combinaram um encontro em frente ao suposto trabalho do golpista.
Ali, Vitor Hugo – sempre apresentando-se com o nome de outra pessoa que nada teve a ver com os ilícitos – mostrou-lhe o veículo furtado e clonado. Após acertada a compra, dirigiram-se ao 5º Tabelionato de Notas (Rua Siqueira Campos nº 1.185), por indicação do vendedor. Nesse cartório foi formalizada a transação, havendo o reconhecimento de firma de Vitor Hugo, como se fosse outra pessoa, tanto na procuração outorgada ao comprador, quanto no recibo de pagamento do valor avençado.
O estelionatário imediatamente embolsou R$ 20 mil em espécie; e mais R$ 10.700,00 foram transferidos (via TED), para a conta de terceiro, informada pelo falsário.
O lesado afirmou que tomou todas as cautelas antes de efetivar o negócio, conferindo os dados do veículo do Detran-RS, mas, em momento algum desconfiara de eventual clonagem, pois as informações lançadas no certificado do veículo estavam de acordo com o prontuário do órgão de trânsito.
Somente alguns dias depois, ao efetuar o pagamento do IPVA do veículo, Ceccon deparou-se com o inusitado: o tributo já estava quitado. Então entrou em contato com o verdadeiro proprietário – em nome de quem fora feita a venda. Este informou possuir um veículo com as mesmas características, razão por que o veículo foi entregue à Polícia, que instaurou inquérito que ensejou a ação penal, em que os estelionatários foram condenados.
Em contestação na ação cível de indenização, o tabelião Sérgio Mânica sustentou que “não é o garantidor do negócio de compra e venda de veículos, a ponto de ser responsável pelos crimes praticados por terceiros, como a clonagem de automóvel e o estelionato“. Afirmou ainda, “passar longe da sua atividade de tabelião a fiscalização policial pretendida, sendo que o lesado deveria demandar contra as pessoas que lhe causaram o prejuízo, mormente por já ter sido suas responsabilidades apuradas na esfera criminal, bastando quantificar o montante a ser indenizado“.
Sentença proferida pelo juiz Mauro Caum Gonçalves, da 3ª Vara Cível de Porto Alegre, julgou procedente a ação, condenando o tabelião a indenizar o valor perdido por Ceccon e a pagar a este também a importância de R$ 12 mil como reparação pelo dano moral.
A essência do julgado foi confirmada pela 9ª Câmara Cível do TJRS que, manteve a indenização material (R$ 30.700) mas reduziu para R$ 8 mil o valor reparatório pelo dano moral.
O julgado do TJ gaúcho reconhece que “a falha na prestação do serviço prestado pelo tabelião gera um sentimento negativo no cidadão, que é suficiente para abalar um dos atributos da personalidade, a honra subjetiva do autor“.
Diz ainda o julgado que “os fraudadores foram responsáveis por boa parte da conduta que determinou a concretização da fraude, mas incumbia ao tabelião, única e exclusivamente, realizar a autenticação, sendo esta uma das funções inerentes à sua atividade, sendo inegável que a correta prestação do serviço teria evitado, ao menos em parte, a ocorrência dos danos.”
No julgamento dos recursos de ambas as partes – há poucos dias pelo STJ – foi dado provimento parcial apenas à pretensão do lesado, a fim de atribuir os juros de mora desde a data do reconhecimento (24 de abril de 2008) – como se fosse autêntica – da assinatura do suposto vendedor.
Além da correção monetária, as duas parcelas somadas (R$ 30.700 + 8.000) terão um implemento de 74% a título de juros (1% ao mês).
O advogado Fernando Gracioli atua em nome do autor da ação (REsp nº 1.453.704).
Fonte: Espaço Vital